quinta-feira, 6 de outubro de 2016
Mudança estratégica da Vale para o S11D gera controvérsia
A decisão da Vale de construir o próximo principal centro de minério de ferro do mundo fez com que investidores enaltecessem a perspectiva de maiores lucros e levou políticos a conspirarem para destituir Murilo Ferreira da presidência.
O presidente da Vale está supervisionando a mudança do foco de investimento e produção futura da mineradora de Minas Gerais para novas reservas no Pará, em Canaã dos Carajás. A mudança culminou no projeto S11D, complexo de US$ 14 bilhões em área onde a qualidade do minério é maior e os custos serão reduzidos. A empresa também está deixando para trás uma região onde os investimentos e as oportunidades de empregos caíram continuamente nos últimos quatro anos, gerando ressentimento.
“O direcionamento da empresa poderia ter sido melhor manejado”, disse o deputado federal Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG), cujo pai foi governador do estado, em entrevista. “A Vale precisa de um presidente que foque em questões ambientais e que respeite as prioridades de investimentos de Minas Gerais e as necessidades de geração de emprego.”
Uma oposição local desse tipo normalmente gera poucas consequências para uma empresa privada, mas a Vale é controlada por uma holding que tem entre seus donos fundos de pensão estatais e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). E as mudanças surgem no momento em que o novo governo enfrenta uma recessão e busca se distanciar de autoridades e executivos com uma lealdade percebida em relação ao governo anterior.
Ferreira assumiu o cargo de presidente em 2011 como parte de uma mudança de gestão realizada pela então presidente Dilma Rousseff. Desde então, a empresa está em uma espécie de montanha-russa. Ao longo desse período, as ações da Vale caíram 66 por cento devido à queda dos preços das commodities em meio à desaceleração da demanda chinesa e à expansão da oferta. Desde janeiro, contudo, há uma recuperação em andamento.
Depois que o presidente da Vale intensificou os esforços em busca de cortes de custos e redução de dívida e os preços se estabilizaram, as ações da empresa deram um salto de mais de 50 por cento, superando o desempenho das rivais. E, no mês passado, o JPMorgan elevou sua recomendação para a empresa para o equivalente a compra. Agora, Ferreira vê uma crescente controvérsia nacional sobre os seus esforços, que estão ajudando no desempenho do papel da Vale e prejudicando uma região do país que foi a “galinha dos ovos de ouro” da empresa.
O projeto em Canaã dos Carajás permitirá que a Vale comece a exportar minério de baixo custo e alta qualidade no início do ano que vem a partir de sua nova mina S11D, usando logística de última geração inexistente em Minas Gerais. Isso diminuirá os custos globais de produção e reduzirá a vantagem das operações australianas de propriedade da Rio Tinto Group e da BHP Billiton devido à proximidade delas em relação às siderúrgicas chinesas.
“É preciso estar no limite inferior da curva de custo”, disse Patrik Kauffmann, que ajuda a gerenciar US$ 11 bilhões em ativos, incluindo títulos da Vale, na Solitaire Aquila, em Zurique, por telefone. “Isso garante sua sobrevivência até mesmo em tempos difíceis.”
A perspectiva de exportar minério de ferro de forma mais barata para a China e de criar milhares de empregos em comunidades pobres no norte do país nesse processo não convence um grupo de políticos de Minas Gerais do PMDB, o partido do presidente do Brasil, Michel Temer. Eles estão trabalhando nos bastidores para tentar substituir Ferreira, de 63 anos, quando seu contrato terminar, no segundo trimestre do ano que vem, disse um integrante do governo com conhecimento do assunto, sem identificar os parlamentares.
Embora as minas de Minas Gerais ainda respondam por mais da metade da produção global da Vale, os gastos no estado caíram continuamente nos últimos quatro anos e atualmente representam uma fração dos investimentos no norte do país.
O presidente Temer não assumiu uma posição pública em relação a Ferreira e a assessoria de imprensa da Presidência preferiu não comentar o assunto. A assessoria de imprensa da Vale, no Rio, recusou um pedido de comentário de Ferreira.
A mudança da Vale para o S11D dá suporte a outras críticas à gestão da empresa por parte de parlamentares de Minas Gerais. Entre elas está a resposta supostamente inadequada ao acidente fatal na barragem da joint venture da Vale com a BHP, no ano passado, disse o integrante do governo, que não está autorizado a falar publicamente. Também não ajuda o fato de Ferreira ser visto como um aliado de longa data da presidente da República destituída.
A animosidade de alguns políticos de Minas Gerais em relação a Ferreira não é compartilhada por Hildo Rocha (PMDB), deputado federal pelo Maranhão, no Nordeste, onde a Vale está finalizando uma enorme ferrovia e uma expansão portuária para atender a nova mina S11D.
“Ele fez um ótimo trabalho”, disse Rocha, em entrevista. “Os investimentos da Vale no Maranhão têm sido muito importantes, especialmente com a crise e os preços baixos do minério de ferro.”
Cardoso Júnior disse que, embora entenda que a empresa precisa cuidar de seus resultados finais, muitas pessoas em Minas Gerais sentem que a Vale deveria demonstrar mais lealdade. Privatizada em 1997, a Vale explorou a riqueza mineral do estado para financiar expansões globais e se transformou em uma das produtoras de commodities mais valiosas do planeta. Até 2009, a Vale era conhecida como Vale do Rio Doce, em alusão ao rio que corte o estado.
As discussões para escolha de um novo presidente para a Vale não foram iniciadas oficialmente, segundo o integrante do governo. Mas se Temer quisesse pressionar para realizar a mudança solicitada por seus colegas do PMDB, algumas das peças necessárias para isso podem ter se encaixado recentemente.
O grupo controlador da empresa inclui a Previ, fundo de pensão estatal administrado pelo Banco do Brasil. Quem chefia a Previ tradicionalmente preside também o conselho da Vale. Temer já mudou a liderança do Banco do Brasil e do BNDES, outro acionista da Vale.
Contudo, para um governo Temer que ressalta sua abertura ao mercado em comparação com o governo anterior, negociar a mudança do presidente da Vale não é prioridade no momento. A possível tentativa de estimular os acionistas a escolher um substituto provavelmente será deixada para o fim do contrato de Ferreira, disse o integrante do governo.
Em relação ao Norte do Brasil, o deputado Rocha aprova o trabalho que Ferreira tem realizado e espera que o Maranhão possa desenvolver sua própria indústria siderúrgica tirando proveito de toda essa nova produção de minério de ferro.
“A Vale criou empregos e está gerando receitas para o estado”, disse ele.
(Agência de Noticias)
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